Minhas Memórias - Capitulo 21


 

Capítulo 21 - O Recomeço


A temporada de verão da peça “O Museu de Cera” foi um sucesso.

A renda da bilheteria foi suficiente para cobrir os gastos e pagar o elenco da peça.
Ganhei um dinheirinho bom, me ajudou bastante nos dias que se seguiram.

Depois que a peça saiu de cartaz, eu comecei a acordar bem cedo, às 5:30 da manhã, tomar café na padaria e sair em busca de emprego.
Eu não podia ficar morando a vida toda no estúdio e comendo às custas do Leonardo e do Zé Martins. 
No período de ensaios, e apresentações da peça, tudo bem mas agora não tinha mais como justificar… Fui à luta.

O meu foco eram os bancos; eles empregavam jovens sem experiência e pagavam razoavelmente bem. 

Comecei a fazer entrevistas nos diversos bancos da cidade e nas agências de emprego também.
Às vezes surgiam uns trabalhos temporários que me ajudavam no sustento enquanto não aparecia nada de efetivo.

No fim das tardes eu voltava para o estúdio e ajudava o diretor nas aulas noturnas. Uma forma de retribuir a gentileza do acolhimento.

Os resultados das minhas entrevistas nos bancos eram ótimos, mas não me chamavam.
Passaram-se dois meses e nada.

Um dia, resolvi voltar ao RH de um dos bancos para saber como estava o meu processo de admissão.

A moça que me atendeu foi muito simpática e me relatou que o meu processo foi muito bom mas havia sido arquivado por ter constado uma pendência na minha ficha cadastral… ? - “pendência ?!!! Que tipo de pendência ?” - exclamei.

O meu nome estava negativado no SERASA. 
O Banorte havia protestado um título meu por falta de pagamento de um empréstimo que eu teria contraído há, aproximadamente, dois anos.

- “Como assim?!!!” — pensei.

Há dois anos eu tinha 21 anos e não trabalhava, não tinha carteira de trabalho e nem a mínima condição de contrair um empréstimo em um banco! 

- “Que gerente louco que me daria crédito?”

Claro que havia alguma coisa errada naquela história.

À noite, conversei com o Léo e com o Zé Martins e eles me aconselharam a ir ao jurídico do Banorte para saber do que se tratava… e assim eu fiz.

Na manhã seguinte fui ao escritório jurídico do tal banco e consegui uma reunião com um dos advogados.
Conversamos sobre as informações que constavam na ficha cadastral do banco e as confrontamos com as minhas informações pessoais.
O advogado não teve dúvidas de que todo o processo de empréstimo estava contaminado, cheio de erros e com suspeita de fraude.

Me perguntou se eu conhecia o Luís Fernando e a Nayde...?

Eu respondi que sim; eram, respectivamente, meu irmão e minha falecida mãe.

Perguntou se eu fui sócio de uma empresa transportadora?

Eu disse que não, mas que havia prestado alguns serviços para uma empresa de transportes do meu irmão, ou da minha mãe, que eu não sabia a quem pertencia a tal empresa, mas que havia prestado alguns serviços para uma transportadora sim e que eu tratava de tudo com os dois.

Ele informou que eu e minha mãe constávamos como fiadores do meu irmão em um empréstimo de grande monta naquele banco e que nenhuma prestação desse empréstimo foi paga, que eu aparecia no contrato como o dono de uma transportadora…. - “Uau!!!”

Eu pedi desculpas, insisti que eu não tinha conhecimento daquela operação e que, mesmo que tivesse, era impossível que o banco me aceitasse como fiador. 

Com apenas 23 anos, sem nunca ter trabalhado, tentando entrar no mercado de trabalho sem conseguir em função de um protesto sofrido pelo Banorte por erro de um funcionário, provavelmente, inescrupuloso, lá estava eu revolvendo o passado da minha mãe, e do meu irmão, querendo seguir em frente com a minha vida.

O advogado lamentou o fato, entendeu que o banco havía errado em algum momento do processo de empréstimo e prometeu ajudar e resolver o problema.

Aquela noite eu não dormi. Na minha cabeça: 

- “Minha mãe, e o meu irmão, me colocaram em uma situação difícil… inacreditável !”… Foi naquela manhã em que ela me acordou e pediu que eu assinasse uns papéis e eu, ainda sonolento, assinei na confiança.

Não era costume a minha mãe me acordar antes de sair para o trabalho, só pode ter sido naquele dia.
Na realidade eu assinei os papéis que me tornaram sócio da transportadora e fiador de um empréstimo que o meu irmão fez no Banorte.

-  “Foi isso! ... mas que sacanagem!!!” - fiquei muito puto.

Não fiquei com raiva da minha mãe, tenho certeza de que foi movida pelo desespero em ajudar o meu irmão. Mas, não ter me contado em vida ?!!!… 

E eu achando que meu irmão estava me ajudando quando me ofereceu o emprego de cobrador na “minha” transportadora. .

Não foi difícil descobrir o destino da dinheirama do empréstimo. 
Estava aplicado no luxo que ostentou no seu casamento, na sua lua de mel e nas obras do seu apartamento da Lauro Müller…. Mas, isso não importava mais.

O importante era dali para frente, conseguir um emprego e seguir adiante com a minha vida, o salário recebido pelo trabalho de iluminação e sonoplastia do grupo de teatro estava acabando.

Acordei cedo, fui caminhando do Catete até a Av. Presidente Vargas onde ficava o escritório do meu irmão.... Fui tirar aquela história a limpo.

- “foi ele que me meteu naquela situação, ele vai ter que me tirar dela” — pensei.

O meu irmão me recebeu com má vontade, foi estúpido e me despachou passando o número do seu telefone — não havia celular naquela época — pediu que eu o esperasse às 17:30 horas no píer da Urca, que ficava próximo da Rua Lauro Müller onde ele morava. Lá poderíamos conversar mais tranquilos, segundo ele.

Eu já não tinha dinheiro para ficar gastando com ônibus, então, só tinha um jeito de chegar lá: ir caminhando a pé do centro da cidade até a Urca.

Cheguei cedo e esperei o meu irmão por umas três horas ou mais. Fiquei sentado no píer observando os barcos e os pescadores.

Meu irmão demorou a chegar e desconversou, disse que não tinha como consertar aquela cagada, que o nome dele também estava sujo, jogou a culpa na mamãe, disse que a ideia foi dela, que com a morte dela ele não sabia como resolver, que a sua esposa não sabia dos seus rolos e que nem podia saber. 

Perguntei se eu podia ir comer na casa dele, era ali perto, já eram mais de seis horas da tarde e eu nao havia comido nada naquele dia.

Disse que não podia me levar pra casa dele, nao lembro o que disse. Eu estava com fome, completamente perdido. 

Antes de ir embora ele marcou de me encontrar no dia seguinte, e nos proximos também, no mesmo horário, 17:30, no mesmo lugar, que me daria uns trocados para que eu pudesse me virar até que a situação se resolvesse ou que eu conseguisse um emprego.

Em seguida, puxou a carteira, me deu um dinheiro, o suficiente para que eu comprasse alguma coisa para comer, e foi embora… Voltei a pé da Urca até o Catete. 

O que me intriga é o fato de não lembrar de ter sentido raiva, remorsos, tristeza, pena de mim, eu so lembro de estar com fome e entrar na lanchonete Amazonas e comer um PF.

No meio do ano, Leonardo e a nova turma de alunos, resolveram apresentar ao publico uma nova peça de teatro. E lá estava eu, no centro do palco, fazendo o meu trabalho de iluminação e sonoplastia, caracterizado como um dos personagens do espetáculo.

O Léo gostava de fazer esse tipo de brincadeira comigo, aproveitava o meu conhecimento sobre dinâmica do espaço, conhecimento esse adquirido quando eu fazia o curso de ator ministrado por ele mesmo, e montava minha mesa no meio do palco, de onde, investido de um personagem mudo, eu exercia as minhas funções em meio a toda a encenação… Era um trabalho de ator também.

Eu adorava o Léo, era um gênio, talvez ainda seja; não sei se ele ainda vive.
Foi atraves dele que dois diretores da Tv Globo me conheceram e fizeram um convite para que eu fosse trabalhar no departamento comercial das organizações Globo, no Jardim Botânico. 

Finalmente, eu estava empregado.


Continua…. Breve mais um capítulo. 


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