Minhas Memórias - Capitulo 32
Capítulo 32 – Nova Friburgo
Eu preciso detalhar os acontecimentos anteriores à minha candidatura a presidente do Sind-Justiça RJ.Como tudo aconteceu, como cheguei lá, por que eu?
Continuando...
Eu me apresentei para trabalhar no fórum de Nova Friburgo em 2 de junho de 1985. Foi difícil me adaptar ao regime de trabalho do servidor público; eu nunca havia tido qualquer vínculo com um regime estatutário.
No período de janeiro até o dia da minha apresentação, tive a companhia de uma mulher maravilhosa, seu nome também era Ana – a segunda Ana da minha vida. Namoramos por um tempo.
Lembro-me de uma noite em que o pessoal da casa saiu para a balada, Ana tinha um compromisso inadiável, e eu fiquei sozinho. A casa tinha uma grande varanda na frente, tipo um terraço.
Na varanda, havia uma piscina redonda, dessas montáveis, onde passávamos as manhãs e as tardes dos finais de semana. Algumas cadeiras de praia ficavam espalhadas em torno dela.
Sentei-me em uma cadeira e fixei o olhar no céu estrelado; a noite estava lindíssima. Procurei Deus. Tive a certeza de que ele estava lá, me assistindo e ouvindo. Conversei muito com ele, pedi que me abençoasse e me mostrasse o caminho. Eu já tinha ultrapassado os 30 anos, e a minha vida ainda era incerta. Nos últimos nove anos, eu tinha vivido uma bagunça; as coisas vinham e iam com a mesma facilidade.
— "Tem alguma coisa errada com a minha percepção", exclamei em voz alta.
Naquele momento, senti o aroma do perfume da mamãe. Foi um momento de paz, eu com a cabeça deitada sobre suas coxas e seus dedos acariciando meu cabelo em um cafuné delicioso. Eu chorei.
Em junho de 1985, a cidade serrana enfrentava um dos invernos mais rigorosos da história. O frio era tão insuportável que, para me proteger, antes de sair do quarto do hotel, eu amarrava jornais em torno dos braços e das pernas antes de me vestir. À noite, o público que participava dos festejos juninos na praça principal da cidade era envolvido por uma névoa densa e fria. Essa névoa, misturada com as luzes das luminárias históricas e o cheiro das bebidas quentes, trazia a magia dos contos para a realidade.
Com a grana da venda da moto, pude financiar a reserva de um quarto em uma pensão de caminhoneiros próxima ao fórum e custear as demais despesas nos primeiros meses. Os salários do Judiciário eram baixos, não chegavam ao piso mínimo. Junto com o minguado salário, vinha um abono para que o piso fosse cumprido. O dinheiro da venda da moto foi útil até a minha adequação à nova realidade.
O meu namoro com Ana não ia bem; eu estava cansado de ir e vir. A rotina da ponte Rio-Friburgo estava me obrigando a tomar uma decisão: uma transferência para um cartório da capital ou a minha mudança definitiva para Friburgo. Decidi pela mudança.
Eu precisava alugar um apartamento na cidade e, graças aos conhecimentos que adquiri trabalhando no fórum, um advogado, dono de uma imobiliária, ofereceu-me, sem fiador, um apartamento mobiliado no bairro de Olaria, um centro comercial distante do fórum uns dez minutos de ônibus. Foi a partir daí que comecei a sentir a vibe de Friburgo, a apreciar suas belezas e a gostar da cidade.
A Praça Getúlio Vargas, a principal da cidade, era rodeada de restaurantes, bares; até mesmo uma boate funcionava em um sobrado em frente à Câmara dos Vereadores, chamada Overdose, que cheguei a conhecer.
A praça imensa trazia o frescor dos diversos eucaliptos espalhados por ela. O povo tinha a pele branca com as bochechas rosadas, uma pintura. Os negros eram como os índios que conheci em Cuiabá. A beleza estava em todos os lugares.
O tribunal continuava chamando os aprovados e os concursados que chegavam de outras cidades enfrentavam problemas, como os que tive, para alugar um imóvel. Comecei a ajudá-los, apresentando a imobiliária do meu amigo, que facilitava todo o processo.
Comecei a me interessar em ajudar aquele povo desinformado sobre seus direitos e procurei farmácias, mercados e até um cinema para firmar convênios que trouxessem descontos aos funcionários do fórum local. Eu tinha muito tempo; o funcionamento do cartório criminal era das 11h às 17h.
Em um determinado momento, os colegas das cidades de Bom Jardim, Cordeiro, Cantagalo, Sumidouro e outros municípios adjacentes souberam dos convênios e me procuraram. Queriam saber como eu havia conseguido. Alguns funcionários dos cartórios extrajudiciais não eram registrados adequadamente, conforme o estatuto do servidor; os próprios titulares não sabiam que tinham direito a aposentadoria especial. Eles descontavam para um instituto de aposentadoria errado; procurei me informar e adequá-los.
Passado um tempo, um grupo de servidores que fazia parte da direção de uma associação que representava o Judiciário fluminense me procurou.
Sem ter conhecimento, meu nome circulava em todos os municípios do estado. Eles estavam trabalhando na transformação da associação em sindicato. Queriam que eu participasse desse trabalho e me tornasse o elo de ligação do centro-norte com a capital.
Designaram-me como delegado para assuntos pertinentes à criação do sindicato dos servidores da justiça na região, com voz e voto.
Eu não tinha a menor ideia da importância daquilo. Nova Friburgo e mais sete cidades adjacentes passariam a ser minha responsabilidade no que diz respeito à política sindical.
A partir da delegacia, comecei a frequentar as reuniões da associação no Rio de Janeiro. As passagens eram reembolsadas. Embora eu não tivesse envolvimento com a política, minha postura começou a ser desenhada como de centro. Eu não compartilhava de muitas decisões das assembleias, mas as respeitava.
O grupo que liderava, optava por lutas nas ruas, greves e manifestações; eu priorizava o diálogo. A nossa diferença estava aí.
Houve um movimento grevista grande; ficamos paralisados por noventa dias. Os rumos tomados pela direção, na minha opinião, não estavam corretos. Muitas informações eram omitidas dos grevistas. O movimento estava se tornando pessoal, entre alguns líderes e o presidente do Tribunal. Eu não achei certo e denunciei em plena assembleia geral.
O resultado foi catastrófico: fui ameaçado pelos membros da liderança e tive que correr dois quarteirões para que não me espancassem. Foi nesse dia que resolvi fazer oposição à chapa da situação. Mas eu nunca pensei que as minhas atitudes fossem me levar a ser uma opção de cabeça de chapa nas eleições sindicais.
Foi aí que recebi o convite para encabeçar a chapa de oposição.
Continua… Breve, mais um capítulo.
Comentários
Postar um comentário